Em 14 de fevereiro de 1990 uma imagem, aparentemente comum, impressionou um dos mais famosos astrônomos da nossa era, Carl Sagan. Foi o registro do nosso Planeta Terra, ocupando apenas 1 pixel da imagem, realizado pela sonda Voyager 1 à incrível distância de 40,5 AU, o qual ele chamou de “pálido ponto azul”, alertando-nos para a necessidade de protegermos o nosso planeta.
Figura 1. Um pálido ponto azul: nosso Planeta Terra, registrado pela sonda Voyager 1 a mais de 6 bilhões de quilômetros de distância.
O tempo passou, a tecnologia espacial avançou e hoje temos “naves” – ou melhor dizendo, satélites – de tamanhos bastante reduzidos – iguais a uma caixa de presentes. São os chamados CubeSat, acrônimo das palavras em Inglês: Cube e Satellite – Cubo e Satélite.
Os CubeSat são um tipo de satélite miniaturizado usado para pesquisas espaciais e comunicações radioamadoras. Os CubeSats normalmente possuem volume de 1 litro (um cubo de 10 cm) e massa de até 1,33 kg. O interessante é que, normalmente, esse tipo de satélite usa componentes eletrônicos “de prateleira”.
Figura 2. Aspecto de um CubeSat. Uma caixinha de 10 cm de lado, cheia de componentes eletrônicos simples que são lançados em órbita baixa da Terra – abaixo dos 800 km de altitude – para fazer experiências mais simples e com um custo bem inferior em relação aos satélites tradicionais.
A Grande Surpresa dos CubeSats na Missão InSight da NASA
A InSight é uma missão do programa do Discovery da NASA para exploração interior do Planeta Marte, usando investigações sísmicas, geodésia e transporte de calor, que irá colocar um único módulo geofísico em Marte para estudar seu interior profundo. Tratarei desse assunto em outro post, no futuro.
Lançada no dia 5 de maio de 2018, com previsão de chegada ao Planeta Vermelho em 26 de novembro de 2018, levou “de carona” em seu veículo lançador alguns CubeSats para diversos tipos de experiências e entre as quais, testar o quão distantes os CubeSats poderiam suportar o recebimento de comandos a partir do nosso planeta.
O resultado: A NASA estabeleceu um novo recorde de distância para CubeSats em 8 de maio, quando um par de CubeSats chamado Mars Cube One (MarCO) alcançou a distância de 1 milhão de quilômetros da Terra. Um do CubeSats, chamado MarCO-B, usando uma câmera com lentes do tipo “olho de peixe”, tirou sua primeira foto no dia 9 de maio de 2018. Essa foto é parte do processo usado pela equipe de engenharia para confirmar a que antena de alto ganho da nave se desdobrou corretamente. Como um bônus, capturaram a Terra e sua Lua como pequenas partículas flutuando no espaço, lembrando o feito da Voyager 1, 28 anos atrás.
Figura 3. Pálidos pontos flutuantes no Espaço. Nosso lar, o Planeta Terra, e o único lugar do Universo onde o Homem já pisou além de seu planeta natal.
Vendo essas imagens não há como não lembrar da emocionante reflexão de Carl Sagan durante uma palestra pública na Universidade Cornell em 1994, quando apresentou a imagem da Voyager 1 sobre o profundo significado atrás da ideia do “pálido ponto azul”.
Olhem de novo esse ponto. É aqui, é a nossa casa, somos nós. Nele, todos a quem ama, todos a quem conhece, qualquer um sobre quem você ouviu falar, cada ser humano que já existiu, viveram as suas vidas. O conjunto da nossa alegria e nosso sofrimento, milhares de religiões, ideologias e doutrinas econômicas confiantes, cada caçador e coletor, cada herói e covarde, cada criador e destruidor da civilização, cada rei e camponês, cada jovem casal de namorados, cada mãe e pai, criança cheia de esperança, inventor e explorador, cada professor de ética, cada político corrupto, cada “superestrela”, cada “líder supremo”, cada santo e pecador na história da nossa espécie viveu ali – em um grão de pó suspenso num raio de sol.
A Terra é um cenário muito pequeno numa vasta arena cósmica. Pense nos rios de sangue derramados por todos aqueles generais e imperadores, para que, na sua glória e triunfo, pudessem ser senhores momentâneos de uma fração de um ponto. Pense nas crueldades sem fim infligidas pelos moradores de um canto deste pixel aos praticamente indistinguíveis moradores de algum outro canto, quão frequentes seus desentendimentos, quão ávidos de matar uns aos outros, quão veementes os seus ódios.
As nossas posturas, a nossa suposta auto importância, a ilusão de termos qualquer posição de privilégio no Universo, são desafiadas por este pontinho de luz pálida. O nosso planeta é um grão solitário na imensa escuridão cósmica que nos cerca. Na nossa obscuridade, em toda esta vastidão, não há indícios de que vá chegar ajuda de outro lugar para nos salvar de nós próprios.
A Terra é o único mundo conhecido, até hoje, que abriga vida. Não há outro lugar, pelo menos no futuro próximo, para onde a nossa espécie possa emigrar. Visitar, sim. Assentar-se, ainda não. Gostemos ou não, a Terra é onde temos de ficar por enquanto.
Já foi dito que astronomia é uma experiência de humildade e criadora de caráter. Não há, talvez, melhor demonstração da tola presunção humana do que esta imagem distante do nosso minúsculo mundo. Para mim, destaca a nossa responsabilidade de sermos mais amáveis uns com os outros, e para preservarmos e protegermos o “pálido ponto azul”, o único lar que conhecemos até hoje.
—Carl Sagan
Nota do autor
Em astronomia, a Unidade Astronômica (abreviada como AU, por recomendação da União Astronômica Internacional) é uma unidade de distância, aproximadamente igual à distância média entre a Terra e o Sol. É bastante utilizada para descrever a órbita dos planetas e de outros corpos celestes no âmbito da astronomia planetária. Em 2012, a União Astronômica Internacional definiu um valor constante e padrão para a UA, até então considerada como aproximadamente 150 milhões de km. O valor da constante é AU = 149 597 870 700 m.